No seguimento de um post anterior, em que detalhei as reacções da glicólise (fase preparatória), aqui ficam as reacções da segunda parte, a fase payoff.
Reacção 6:
Esta reacção é catalisada pela gliceraldeído-3-fosfato desidrogenase e trata-se de uma reacção dupla. O substrato vai ser oxidado (o grupo carbonilo passa a carboxílico), e depois vai ser adicionado um grupo fosforilo ao carboxílico recém-formado, através de uma ligação fosfoéster. Portanto, a reacção produz NADH (resultante da oxidação do substrato) e consome fosfato inorgânico (Pi). Esta adição do grupo fosforilo vai conferir ao produto (1,3-bisfosfoglicerato) um elevado potencial de transferência de grupo fosforilo, ou seja, vai tornar a molécula quimicamente instável, pois trata-se uma molécula pequena (só tem 3 carbonos) mas com muitos átomos electronegativos (vão haver muitas repulsões electrostáticas). Esta instabilidade vai ser útil para compreendermos o que se passa na reacção seguinte...
Reacção 7:
Esta reacção é a primeira da glicólise que vai levar à síntese de ATP e requer a presença de Mg2+. É catalisada pela enzima fosfoglicerato cinase (o nome da enzima deriva do sentido inverso da reacção, que ocorre durante a fixação fotossintética de CO2). Na reacção anterior eu referi que se formava um composto quimicamente instável. Essa instabilidade vai fazer com que o 1,3-bisfosfoglicerato tenha tendência para perder um dos seus grupos fosforilo (originando 3-fosfoglicerato), libertando uma grande quantidade de energia (convém lembrar que uma molécula é tanto mais estável quanto menos energia interna possuir...). Portanto, ao perder o grupo fosforilo, torna-se mais estável, pois perde energia. Essa energia vai ser utilizada para acoplar à reacção uma segunda reacção (que necessita de energia para ocorrer): a síntese de ATP! De facto, o grupo fosforilo libertado é adicionado ao ADP, originando ATP. Como o grupo fosforilo é proveniente de um substrato, esta síntese de ATP designa-se por fosforilação ao nível do substrato. No entanto, a questão que provavelmente alguns estarão a pensar é: "Então não era melhor adicionar logo o fosforilo ao ADP na reacção anterior? Porque é que nos damos ao trabalho de primeiro transferi-lo para um interemediário, se na reacção seguinte o vamos remover?" A resposta a essa dúvida prende-se com a termodinâmica das reacções envolvidas. Ou seja, a energia libertada na oxidação existente na reacção 6 não é tão elevada como a que é necessário gastar na síntese de ATP. Por isso, só existem 2 hipóteses... Ou não se utiliza essa energia da oxidação, o que era um desperdício, ou conserva-se parte da energia libertada sob a forma de um composto químico energético, o 1,3-bisfosfoglicerato (é isto que se passa!). Assim na reacção seguinte já vamos ter energia suficiente para sintetizar ATP. Juntos, os passos 6 e 7 demonstram o papel dos grupos fosfato na conservação da energia metabólica, que eu referi no post sobre as reacções da fase preparatória da glicólise.
Reacção 8:
A enzima que catalisa esta reacção é a fosfoglicerato mutase e é dependente de Mg2+. O que esta enzima vai fazer é transferir o grupo fosfato da posição 3 para a posição 2 do substrato. Na realidade, esta transferência não é directa... A enzima activa possui um grupo fosfato, que transfere para o substrato, originando um intermediário designado por 2,3-bisfosfoglicerato. Esta molécula é um importante modulador da afinidade da hemoglobina para o O2! Seguidamente, o 2,3-bisfosfoglicerato cede um grupo fosfato à enzima, convertendo-se em 2-fosfoglicerato e regenerando a forma activa da enzima.
Reacção 9:
Esta reacção é catalisada pela enolase e é um exemplo de uma reacção de eliminição. O que esta enzima vai fazer é remover uma molécula de água do substrato, criando uma ligação dupla. Como as ligações duplas são regiões ricas em electrões, a presença desta na proximidade do grupo fosfato vai fazer com que o produto, fosfoenolpiruvato, apresente novamente um elevado potencial de transferência de grupo fosforilo. Esta reacção requer a presença de Mg2+.
Reacção 10:
Chegamos à última reacção da glicólise... Nesta reacção, catalisada pela piruvato cinase (terceira enzima regulatória da glicólise!), o fosfoenolpiruvato vai perder o grupo fosforilo, libertando uma grande quantidade de energia. Novamente, essa energia vai ser parcialmente conservada sob a forma de uma molécula de ATP. Esta reacção é irreversível e requer a presença de Mg2+ (ou Mn2+) e K+.
Principais fontes bibliográficas:
- Quintas A, Freire AP, Halpern MJ, Bioquímica - Organização Molecular da Vida, Lidel
- Nelson DL, Cox MM, Lehninger - Principles of Biochemistry, WH Freeman Publishers
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